Descoberta do Dia
Acabei de descobrir o que já sabia faz tempo. Desvendei o mistério, mapeei o labirinto. O mais incrível nessa descoberta, entretanto, foi descobrir que não descobri nada que eu já não soubesse. Constatação máxima da ociosidade da alma humana. A gente deixa assim o que incomoda muito, tentando ignorar aquela coisa que incomoda, na esperança de que ela se canse de incomodar e vá embora. É uma preguiça reativa, na qual a lei da ação não reage reação alguma. Inércia total de atitude. Ou inépcia.
É aí, então, que o tempo se aproveita e vai passando como quem não quer nada. E, se a coisa que incomoda ficasse quieta, passaria ao largo também. Mas, a coisa insiste. Vira e mexe, se mostra presente, dá uma cutucada só pra lembrar que está lá, observando a gente. Depois, faz que nem era com ela e sai abanando o rabo. Não sem antes deixar um rastro de desgosto, de uma sutil e milimetrada sensação de humilhação.
Humilhados, é assim mesmo que a gente se sente, porque sabe da coisa, vê a coisa, sente a incomodação da coisa, mas não faz nada. E o tempo passando ajuda nesse nadafazer quase cataléptico. Quanto mais tempo se passa, menor a reação perante a ação que incomoda. E a coisa sabe disso.
Fico agora pensando quantos textos sobre a coisa que incomoda eu já escrevi. Cada linha igual à outra, à próxima. Esse é o efeito do tempo que passa. Ainda percebo a coisa. Ela ainda incomoda. Pra dizer a verdade, incomoda cada vez mais, essa mesma coisa. O medo é, um dia, parar de perceber e acostumar com o incômodo. Quando não der mais bola, talvez o tempo pare de passar.
No entanto, como a coisa que incomoda, e que foi descoberta mais uma vez, é cada vez mais incomodativa, creio que não desapareça. Nem por inércia, nem por costume. Vai é continuar crescendo feito hera, tomando as paredes e tentando encerrar a percepção. A minha, no caso. Não há o que fazer. E agora que descobri, o tempo hoje vai passar depressa. Vai tentar persuadir a consciência, vai tentar fazer parecer normal o incômodo. E vai acabar conseguindo, como sempre.
Será que a coisa sabe o quanto incomoda? Será que sabe que causa incômodo? Que, por ela, o tempo me envelhece mais? Creio que saiba e que não se importe. É a verdade. Talvez, até, se divirta. E o que mais dói na percepção, na descoberta, é que a coisa que incomoda nem sequer vai se dar ao trabalho de ler esse texto.
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