Concessões
Eu não mais farei concessões. Sejam quais forem. Sob qualquer pretexto. Não mais andarei sobre lâminas tensas por amabilidade ou proteção. Posto que essas reverências são impostas, não compartilhadas. Tampouco retribuídas. Eis a regra da contradição, do amargamento da boca. Eis o sentimento de furto, de engodo. Eis. Quando me dobro por ti e nada tenho em retorno.
A partir de agora, já não terei a piedade de ceder as tuas vontades. Não me interessam mais teus olhos de labrador, tuas necessidades sempre urgentes, teus mil compromissos inadiáveis. Já basta! A partir de agora, o que quiseres de mim, terás de me dar em troca. E como sei que és incapaz de tal façanha, exerço meu poder de barganha e te digo um sonoro “não”.
Sou má? Insensível, quem não diria? Pobre diabo, tão maltratado pela bruxa. Pobre de ti. É realmente uma lástima de homem, tão moralmente traído por esta que já não vai te servir. Que digam dessas balelas pelo tempo que quiserem. Não me custa. Pois que todos os meus te preferiram. Nada há para mim, sequer companhia, sequer sorriso breve. E essa secura de servidão, isso sim, me fará sorrir!
Desiste, então, se pensas que cederei a qualquer dos teus encantos, dos teus charmes, das tuas ousadias e das tuas chantagens. Já nada dessas baboseiras me toca. Entende. Gastaram-se todas as moedas, todas as vidas do jogo, todos os amores que eu nutria por ti, todas as condescendências, todas as concessões.
Acabaste te tornando mais um fardo, mais um desgosto. E agora não adiantam tuas lágrimas e teus pedidos. Já está feito. Gasta teu latim com a próxima que te fará favores. Há sempre uma solitária precisando de algo a ocupar o tempo. Passar bem, meu antigo dono. Minha coleira já se partiu.
Comentários
Viver é um suplício, e o que seria se tivéssemos que sempre barganhar sem ganhar? Seria um tormento maior.
Para alguém me tirar de meu mundo triste e seguro, deverá trazer a alegria reconfortante de um longo beijo, de um forte abraço, de uma boa memória, de um porto seguro...não mais os amores de cabotagem, a memória curta, um abraço distanciado, um beijo em parcelas...!
Chega de concessões atabalhoadas.