Arranhaduras



Vivemos como queremos. Fazemos coisas sem pensar, por hábito ou demência. Por provocação, flagelo. Cada um tem seu anjo e seu demônio a perturbar a mente, a impelir vontades. Mas somos responsáveis por todas as nossas arranhaduras. Levamos o dolo ou os louros de cada ato cometido, de cada crime cotidiano. E insistimos.

Sabemos, quase sempre, quando estamos errados, quando a ação deve ser repensada. Paramos? É claro que não. Somos seres teimosos e exagerados. O que fazemos, fazemos muito. E as consequências reverberam no dia seguinte. Estragam o paladar, pesam na consciência. Vergonha que não é alheia, é bem pessoal. Ainda assim, insistimos.

Chutar balde ou cachorro morto é uma prática comum. Investimos em machucados e machucar-nos torna-se um vício. Precisamos da dor para viver. Precisamos da culpa. Mas não para tomarmos outro rumo, repaginar-nos, apenas para nos fazer companhia enquanto não chega a hora fatídica de outro açoite.

E isso perdura por vidas... até que o corpo adoecido, a sensatez despedaçada, ou até mesmo o olhar triste de quem vemos a nos ver a cada recaída cobram uma mudança, um qualquer remediar, um melhoramento. É nesse segundo que percebemos que os arranhões infeccionaram, gangrenaram. Que precisamos de amputação.

Tolo é aquele que se acredita imortal e evita olhar as próprias chagas no espelho. Dorian Gray, como disse Roberto. Mas, nesse caso, somos nós a pintura apodrecida. Resta saber se temos ainda força e coragem para aparar as unhas, para lavar o rosto e dar a cara a tapa. Resta saber se queremos ou merecemos a cura.

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