Crônica Triste
Tarde se faz a hora arrastada. Tarde se nota no olhar
cansado. Tarde da noite, do ser, do pranto. Entardecer que não tem estrelas
bordadas no manto. Tarde é a medida do tempo que passou sem fazer barulho. E
que deixou por rastro apenas o calar das horas.
Rastro sem mácula, sem forma, sem conteúdo. Ranço do tempo,
desse tempo sem destino. Cântico de mortalha, ladainha de carpideira perante o
caixão aberto. O túmulo. Esse é o tempo que se faz tão tarde, tão antes.
Ilusória essa veia de medir tal tempo, tentando alcançar os
minutos que escapam do presente. Aridez, certeza ausente. Gosto de fel e morte
a empapar a língua. Resta esperar o final iminente da trovoada após o relâmpago.
Som de tragédia, de rufar de tambores. Som de dissabores
rolando pela garganta. E o pranto também espreita o tempo. Esse que engole o
choro para se fazer de forte. Esse que chora por dentro ante o temor da morte.
Tarde se faz no mundo escuro da vida que passa. No muro que
cai aos pedaços, envelhecido. Tarde assim, no paraíso perdido, esse que é feito
de sonho, de desejo, de planos... Cálido acalanto do desengano. Só a voz da ruína
a lamuriar o fardo.
Enganado está, pois, aquele que espera por um final feliz. Equivocado
e delirante, esse tal amante, ambicionando o derradeiro beijo. Já que não há
mais desejo, o coração, por si mesmo, se cala. Já não grita, não mais implora.
Apenas desiste. E aquele rufar de tambores é somente ruído.
Zumbido que incomoda tímpanos. Barulho do ocaso do tempo. E
volta esse tempo a nos reivindicar virtude. A dizer: “Não te ilude. Tu és
apenas mais uma.” Uma dentre tantas almas que ousam sonhar o impossível. Tristes
de nós, crônicas ultrapassadas, invisíveis.
Apagamos a chama da vela acesa. Deixamos de lado a vaidade e
a paixão. Cremos e descremos na valentia da vida, essa sofrida, sem trégua, sem
dó. E tudo termina num pestanejar tristonho, pois que é findo o sonho. Esse
sonho de amor que nos fez viver até então, até o não, até o fim.
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