Virtual



E cá estou eu, gelada até os ossos, outra vez olhando fixo a tela clara do computador... E cá estou, novamente a esperar sinal. Não aprendo? Já não basta? Não bastava antes? Não bradei que cessaria essas rompâncias, essas penúrias, da última vez? Da penúltima?

Sim, faço promessas que não costumo cumprir. Promessas a mim mesma como milho às pombas do parque. Elas nunca agradecem. Sequer sabem quem é que as alimenta. Sabem apenas da fome e da vontade de comer. Pombas e promessas são frívolas. E eu outra vez me pego a catar grãos pelas reentrâncias do caminho.

Mas não é minha culpa desta vez. Já falei isso? Não é meu pecado. Não maculei a eternidade da promessa. Fui compelida, iludida, imolada. Virei troféu, sacrifício, ícone de pedestal. Ao menos, me senti assim quando ele chegou do nada dizendo “te gosto”. E eu gostei da iniciativa, confesso...

E ele chegou tão cheio de meiguice, tão de mansinho, tão menino... Juro, estava quieta. Nem me movi. Ao contrário, até gargalhei da brincadeira. Mas não era brincadeira. Era?... E ele continuou por aqui, na tela, na mente. E ele avançou tão sutilmente, que não percebi quando ultrapassou a barreira do acaso.

Acaso, necessidade, surpresa... não sei. Só sei que ele conseguiu o impossível. Conseguiu tocar meu coração já tão pisoteado, já tão escasso... Conseguiu me fazer ter saudade de alguém que ainda nem vi. Conseguiu me fazer desejar a pele que não toquei. Conseguiu-me!

Mérito dele, falha minha. Isso não vou saber. Sei apenas que deixei – e isso sim, de livre vontade – ele chegar perto, se sentir dono, se sentir meu. E os percalços que nos afastam me enervam, me irritam. E me vejo a entristecer pela falta que ele já me faz... E me vejo a me apegar a uma foto, um perfil, uma possibilidade nova de amor, mesmo que virtual ainda...

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