O Limiar do Sonho



As fronteira da capacidade humana de amar são exímias ocultadoras de sentimentos. Essas linhas invisíveis são verdadeiros campos de força, programadas que são para desintegrar todo e qualquer ansiar meramente vulnerável. Como se o amor vivesse numa redoma vítrea, imaculado e puro. Como se soldados bem treinados guardassem o núcleo do coração dos males sórdidos do mundo lá fora.

Bem equipado é o maquinário de defesa do amor. Sistemas intransponíveis rastreiam cada polegada do perímetro da cerca anti-sentimento. Somente os bons e inofensivos afetos passam pela vigilância e têm, quem sabe, permissão de se estabelecer por tempo determinado... ou para sempre.

Mas todo sistema tem falhas, até os mais complexos. E a falha das defesas do amor é o sonho. Sim, o sonho. Esse que vagueia livre e infalível, esse que é o próprio pensamento inconsequente. Esse sonhar contínuo carrega em si mesmo o legitimar sentimental de qualquer querer, de qualquer desejo. E invade, liberto e flutuante, os domínios do recatado amor.

E é no embalo sonâmbulo do sonho que as fronteiras do amor fraquejam. É no limiar do sonho que o sentimento penetra, sorrateiro, o núcleo tão protegido do coração. É no sonho e pelo sonho que o casto amor se desvirgina. E sonha e sente e, por fim, por mais que suas defesas se esforcem... por fim, o próprio amor sonha... e se apaixona... pelo sonhar...

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