O Ninho das Águias
Alça voo tal errante a ave de
rapina faminta. Alça outro flanar em pleno ar, elevar latente, intermitente, em
busca de sangue fresco. Sobrevoa ravina, deserto, rochedo. Plana, leve e mortal,
o pássaro caçador. Presa é qualquer vida que se mova, lá embaixo, no reino
terrestre. Sim, pois que o reino da águia é o azul pleno do céu.
Mal sabe essa ave imponente que
outra igual a ela alça o mesmo voo, oposta e oponente, do pico longínquo e fora
do olhar. Essa outra, grande e forte, um macho dominante nos domínios do ar. Caçador
infalível, sedento, belo e viril, violento, vai de encontro ao alvo ainda
incauto, ainda oculto.
Sobre a pedra órfã, sobre o pico
alto da montanha mais distante, as duas águias caçadoras se deparam, se
confrontam. Olhos nos olhos, força medida. A fêmea absoluta, o macho dominador.
E voam um ao redor do outro, estudando minúcias, analisando malícias... e
decidem pousar, juntas, as águias, sobre o pico mais alto.
Ali, um ninho abandonado, oculto,
se faz evidente. E a fome premente das duas feras aladas se desfaz em cobiça. Secreto
desejo. Olhos e penas e bicos. As duas aves se unem sem aviso, sem pudores, sem
decência. Apenas o instinto fazendo eriçar plumagens. Dor e fogo, deleite, urgência.
Duas águias magníficas contra o sol, apaixonadas pela vida.
O girar do planeta urge o
aconchego dos amantes. Pena à pena, elas se separam... o macho majestoso, a fêmea
renovada. Um último roçar dos bicos curvos e letais... cada qual voa de volta a
seu próprio ninho, sua própria pedra. Saciados, completos, almas livres e
afins. E o céu continua a volver estrelas, enquanto o ninho oculto no pico da
montanha espera o retorno dos amantes emplumados...
E eles hão de retornar...
Comentários