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Mostrando postagens de junho, 2011

Expiação

Pensei muito em como começar este texto. Não quero que se trate de um texto de desculpas. Muito menos um de pedir desculpas. O fato, enfim, é que a espada na ponta da pena, da língua, é muito mais afiada. É possível sublimar a si mesmo a ponto de ofuscar-se aos outros. Àqueles que importam mais. Nada mais é a arrogância que um desmazelado grito de insuficiência, de ignobilidade. Nada mais é a rompância que um arroto de vulgaridade, de insignificância. E, por vezes demais, nos fazemos presunçosos de nós mesmos, de nossos poderes, de nossos saberes, de nossas penas. Há o intelecto e há a real possibilidade de usá-lo. Instâncias distintas. Um domina o outro? Duvido. O que há em nós, os orgulhosos detentores da palavra, é pura soberba. E, para alguns, nada resta senão seu pecado original. E mergulhados neles permanecerão, quiçá, eternamente. Enquanto isso, seus rabiscos germinam ou morrem, doam-se ou vendem-se. Tanto faz. O que interessa a esses pecadores assoberbados é a exata medi

Rapsódia em Azul

Para Roberto Muniz Dias – Gosto de Gershwin – disse ele, tentando encerrar a conversa. – Ah, cold jazz. Você conhece Stan Getz e Chet Baker? Claro que conhece. A versão de Stella By Star , que os dois interpretam juntos, é a minha preferida. Ele não conseguiu interromper a virada de cabeça e o olhar de espanto na direção da moça. Chet Baker? Ao fundo, algo parecido com um New Order fora de tom ajudava na bizarrice da situação. Ele sabia que sua expressão era uma mescla de dor e susto. Não podia evitar. Ela deu mais um gole em sua bebida, sem olhá-lo de frente. Súbito, ele sentiu necessidade de se desculpar. – Gosto de Beatles... gosto de Rita Lee cantando Beatles – e depois de um segundo. – Conhece? – Sim, tenho esse CD. Mas, voltando ao jazz, você conhece Wild Man Blues , o disco do Woody Allen? Aliás, meu escritor favorito. – Cineasta – rebateu ele. – Sim. Mas, você já leu Cuca Fundida ? É fantástico, vários fragmentos de roteiros e contos. E combina perfeitamente com o jazz que el

Nós Dois

Não sei o que mais me dói. Se mirar teus olhos castanhos sempre sorridentes ou antecipar o aroma dessa tua pele canela. Não sei se o que me dói é tua ausência próxima, ou tua presença distante, constante, arredia. Só sei que me dói a espera. Dói-me esperar por ti. Sei que não deveria ter-me deixado assim, tão dependente. Mas é que depois de tua risada – aquela risada largada, sonora, gostosa, carinho na orelha – do outro lado da linha, me peguei a fantasiar quando rias. Tenho certos ciúmes de teus afetos, de teus fazeres, de teus estudos. Tenho certos ciúmes de teus sumiços, de teus chamegos, de tuas filosofias. Compreensível? Já não sei dizer. Só sei que tenho, esses ciúmes. Só sei que te sinto parte inata de mim. Pretensão? É possível! Pois que antecedentes me dás para que eu te queira para mim e mais ninguém? Ciúme de amigo, quem sabe? Desculpa esfarrapada, confesso. Mais que amigo, mais que meu, eu mesma, nós dois. Há um tanto de mim que é tão teu que, por vezes, te esqueço como

Espelho

Não fique triste. O tempo da tristeza já passou. Sob a neve estéril ainda há vida. Sob as lágrimas, sei que seus olhos ainda brilham. ‘Brilham pelo pranto’, você me dirá. E eu lhe lembrarei o quanto mais brilha o seu sorriso. Não fique assim tão triste. A vida é mais do que sonho. Os sonhos são sonhados e só. Não os cultive, apenas aproveite enquanto não se desfazem ao amanhecer. E, pela manhã, é preciso ter a coragem de se olhar no espelho e entender que ainda há espaço pra realizar. Pra ser feliz! E você é valente, eu sei. Tristeza não combina com você. Não dê ouvidos a esse desejar latejante. Viver é mais que meros desejos. Esses, eles vem e passam, saciados ou não, perdem-se entre lençóis sujos de hotéis escuros... Deseje reconciliar-se com aquele do espelho, aquele que fez você tão forte, tão único, tão humano. Consegue se lembrar de quem você é? Não se deixe perder de saudade. É sorte do mundo ter você. Tenha saudade desse que você deixou aí trancado, esse que olha pra você no

Não Vou Mais Amar Você

Chega! Não vou mais amar você! Já basta desse querer à distância, e se não fosse a distância seria outra coisa, outra realidade. Tudo em nós nos afasta, apesar de tudo o que nos aproxima. Paradoxo fora de contexto, fora de tempo, de ato, de fato, de pele. Eixo quebrado de circunstâncias insolúveis. Por tudo isso, deixo de amar você. Deixo agora, para nunca e para sempre. Já estou farta, já estou exausta, já estou tão velha pra essa brincadeira de gato e rato. Eu sou o rato? Ratoeiras à parte, devo admitir que é extenuante te amar assim. Cansa mesmo, acredite. Dia a dia, sem saber se você lembra de mim. Essas e outras me fizeram decidir parar de amar você. Entenda, nada pessoal, tudo pessoal, tudo ao contrário. Se ao menos essa lástima, essa guerra, esse não interagir homem-mulher se extinguisse... Se ao menos, nessa dualidade, o homem fosse eu e você fosse... você. E fosse meu. Então, vim apenas anunciar que estou, em definitivo, abdicando de amar você. Deixo meus tesouros à próp

Verdade (?)

Um sentimento pode ser tornar um fardo tão pesado que, quando nos despimos dele, sentimos falta da claustrofobia.

Teoria do Amor Inequívoco

Eis que o momento propicia, pela véspera, uma rápida análise sobre o que se costuma chamar Amor . Primeiro, Aurélio de Holanda nos diz que amar é “querer muito bem a; sentir ternura ou paixão por; ter afeição, dedicação ou devoção a; prezar; gostar de; possuir; estar enamorado (...)”. Mesmo na definição mais acadêmica, é comum encontrar essa emoção tão cantada pelos poetas, tão explorada pelos literatos, associada ao ato de sofrer, à lamúria, às lágrimas e à dor. É a isso que a tese do Amor Inequívoco repudia! Amar não é consternação, tampouco sofreguidão! Não deve ser! O que dói é o ciúme, a posse, a cobiça, o apego, o ver-se solitário, insatisfeito. Nada disso, entretanto, é amor. Nem mesmo a paixão – sinônimo de martírio – é amor! Paixão é fogo que excita o corpo, é sexo, é química. Paixão é um doer-se autoinfligido tão profundo quanto inconsistente. Posto que paixão é passageira e volátil como o gosto do chocolate na língua. Amor é mais! Amar alguém é o apuro dos sentidos, é o

Sobre Leituras Sutis

Sei quando gosto de algo porque me pego sorrindo para o texto... e, normalmente, ele sorri de volta! É um dar e receber atrevido entre mim e o palavrório, por vezes florido, por vezes tosco, mas sempre intenso. Sei quando o texto me gosta quando o pego olhando para mim de soslaio, arremeçando chispas como se me pedisse "leia-me mais". Ando lendo textos que me querem mais, ultimamente! (para Roberto, ele entenderá!)